Tendo em vista a atual crise econômica, muitos aconselham que o Brasil sustente o seu crescimento via demanda interna. A motivação para tal vem do fato de que o Brasil, no último ano, cresceu muito em função de crescimento do consumo e investimento nacional (e menos em função de exportações). Argumenta-se: por mais que a queda nas exportações (decorrente da recessão mundial) possa vir a gerar desemprego, ainda assim, deveríamos poder sustentar o crescimento do pais, via política monetária mais frouxa e maiores gastos do governo. Por que devemos deixar que o nosso crescimento seja dependente do resto do mundo?
A defesa de tal tese, porém, incorre em um grave esquecimento da história brasileira. Na época do governo Geisel, para evitar as conseqüências do primeiro choque do petróleo, criou-se o II PND (que, com verbas do governo, procurava incentivar o desenvolvimento de indústrias de bens de capital e insumos) e o Pró-Álcool (focado em reduzir a dependência brasileira do petróleo). Por mais que o governo Geisel tenha sido bem sucedido em sustentar algum crescimento, o resultado foi endividamento externo. Uma vez tendo explodido o segundo choque do petróleo, apareceu a crise no Brasil.
Algo semelhante poderia ocorrer atualmente. Fosse o Brasil começar a crescer com base em demanda interna, teríamos um aumento nas importações (acompanhado de queda das exportações), o que geraria endividamento externo. Em um cenário ruim, no qual o mercado financeiro americano permaneça com problemas durante muito tempo, estaríamos, dentro de alguns anos, numa posição desconfortável de grande endividamento externo e pouco capital internacional disponível.
É verdade, em 2008, o Brasil teve crescimento em torno da demanda interna (com queda nas exportações líquidas), e ao mesmo tempo, a dívida externa líquida brasileira chegou no seu mínimo. Ou seja, exatamente o contrário do que enunciei acima. Porém, o que possibilitou esse acontecimento em 2008 foi a grande quantidade de Investimentos Diretos Estrangeiros no Brasil. Em momentos de crise como a atual, o pouco capital internacional disponível dificultaria os investimentos diretos, e portanto, a repetição de 2008.
Só seria capaz de conter esse cenário a possibilidade de depreciação cambial sem inflação (isso conteria o avanço das importações e do endividamento externo). Porém, isso só é factível se tivermos um Banco Central com capacidade de ancorar as expectativas inflacionárias, mais normalmente feito via sistema de metas para inflação, e com autonomia para agir contra a inflação.
Vivemos um momento de crise internacional, a mais grave desde a crise de 29. Ao mesmo tempo, não enfrentamos nenhum grande choque de demanda interna (via consumo ou investimentos). Nesse caso, se existe alguma possibilidade de sustentarmos algum crescimento, ela depende crucialmente de independência do Banco Central e de gastos governamentais responsáveis. Qualquer alternativa tem grande risco de resultar, a médio prazo, numa nova década perdida. Só teremos espaço para uso de políticas de estímulo econômico se tivermos queda forte de demanda interna (via consumo e investimentos).
Obs.: Agradeço sugestões do Ricardo, e como não podia faltar, "all further mistakes are of my own responsibility".
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